domingo, 18 de junho de 2023

Viver é muito perigoso

 

Essa frase usada de modo tão banalizado por aí ecoa cada vez mais na minha cabeça e nas fibras do meu corpo.  Viver é perigoso, Riobaldo estava certo. Viver é autorizar as dores, as alegrias, as efemeridades, os vícios e as fugas. Embora de idade avançada, eu cedi essa autorização faz pouco tempo na minha vida.

É na terapia que aprendo que o arriscar é parte fundamental de viver, e como todos os vovôs sabem: quem não arrisca, não petisca. Coloco na conta dos últimos dois anos minha reorganização. Quem me disse que o melhor é o seguro, estava mentindo. Quem me disse que é melhor um passarinho na mão que dois voando, estava mentindo. A segurança e o controle me trouxeram fragilidade. Todo dia sou eu acordando na vida para me fortalecer.

Agora eu entendo cada vez mais que sentir não é errado.  Que precisar chorar não é fraqueza, recolher-me para sentir minhas dores é o que me cura, meus desejos não são frescuras, eu sou uma pessoa de verdade. Eu erro, falo alto, rio na hora errada, gaguejo quando preciso ser firme, falo demais e tenho preguiça. Só eu posso chorar quando estou triste.

Viver é perigoso, viver é horrível e delicioso. É bom estar viva, é bom estar na minha pele, sorrir e sofrer do meu jeito.

segunda-feira, 12 de julho de 2021

Life goes on

Voltei ao meu blog antigo e percebi como eu escrevia diferente. Acho que a juventude traz a criatividade, ou o não medo de escrever. Agora, me considero sem assunto, ou tudo o que escrevo parece chover no molhado.

Às vezes me culpo por isso,  entendo que é importante nos cercarmos de coisas inspiradoras, ir em busca das tais referências que de forma mágica se transformam em ideias, e viram palavrinhas organizadas numa folha (é o que dizem).  Vez ou outra me sinto disposta para criar, mas meu juízo fica desorganizado e não se converte em devaneios aproveitáveis.

Vou ser sincera: eu escrevo, escrevo sempre que preciso porque é uma forma de me desenrolar. No meu caderninho oficial, no meu outro caderno, deixo salvo como rascunho, esboço um sketchbook mais criativo. Faço uns desenhos, tenho ideias; e então me indago se é apropriado querer falar quando já se tem vozes de mais soando alto por aí. As opiniões são quase sempre dispensáveis.

Outro dia fui pega de surpresa, 7h10, na entrada do trabalho, me disseram “ontem eu li o seu blog”. Primeiro pensei em me desgrudar das palavras, depois fiquei vaidosa a ponto de nem perguntar se tinham gostado. Apenas disse: “ah, é?”.  Fui tão sem graça quanto minhas ideias.

Agora, volto a essa preocupação. Não sei se perdi a criatividade, se o avançar dos anos me deixou naturalmente entediante, ou se é apenas uma questão de hábito, de costume. De qualquer forma, preciso tirar a prova real.

 

sábado, 31 de outubro de 2020

31 de outubro

     Hoje é o Halloween, essa data não é bem da minha geração, ou do meu recorte social. Por isso não entendo esse frenesi, mas sei que isso é problema do meu ser antiquado. 

    Hoje é 31 de outubro, aniversário do Drummond, eu acho um pouco carne de vaca falar que Drummond é o poeta favorito, porém, se alguém me dizer que não topa com seus poemas, certamente olharei horrorizada, vou sempre me lembrar dessa fala e serei eternamente desconfiada da índole da pessoa. Mas como sou gente de boas relações, isso nunca me aconteceu.

    Então, hoje é o aniversário do Drummond, o "formidoloso tímido" como disse Mário de Andrade. Às vezes não sei se sou eu que conheço os seus versos, ou se são os versos que me conhecem e me acham por aí, de modo que não lembro quando entraram na minha vida e começaram a fazer sentido. 

    Estou falando dos versos daquele que não será poeta de um mundo caduco, cujos ombros suportam o mundo, que está de coração seco, aquele das retinas fatigadas, gauche na vida, viu a máquina do mundo se entreabrir, ou que tem apenas duas mãos e o sentimento do mundo, e, por fim, aquele que é de Itabira, a qual hoje é só uma fotografia na parede -- e como dói!

    Entre tantas palavras e ideias, conforme acredito, fazem-me entender ou embaralhar o meu sentimento do mundo, fica a imagem do poeta de tantas fases no meu imaginário, e com a vantagem da intimidade entre nós, que sempre encontra um ponto de contato nas minhas frágeis e simples experiências de vida.  




quarta-feira, 19 de agosto de 2020

Problema que não merecia um texto

 

Ah, as mudanças que acontecem ao completar 30 anos. Minha amiga se adiantou, e para evitar qualquer drama, disse “os 30 são os novos 20”. Desde então, meu mantra.

Meu incômodo não está no pretexto do fardo das obrigações. No fundo, até gosto de ter meus compromissos e de ter que resolver problemas cotidianos, de certa forma provam minha utilidade no mundo. O estranhamento é sentir como me sentia há exatos 10 ou 15 anos. Não sei se é uma revolta psíquica, ou apenas a revelação da verdade absoluta, mas percebo que apesar das mudanças naturais que ocorrem na vida durante os vinte anos, tenho na verdade os gostos e ideias de sempre, de modo que aprecio os mesmos escritores ou estilos, gosto das mesmas bandas e, mais do que nunca, aceito viver o dia trivial um pouco culpada, conversar sobre o que os outros me propõem, para à noite, neste exato momento do silêncio, ser quem sempre fui, e enfim visitar a página em branco, pesquisar entrevistas no Youtube, reler aqueles capítulos de sempre que confortam ou me colocam em desespero.

Sim, sei que isso não é exclusividade minha, creio que a maioria das pessoas deve se sentir de alguma forma um pouco errada por dentro, um pouco sem saber como se expressar para o mundo tal como se sente no íntimo, e assim criar a caverna do bem. É só que de repente, precisei de trinta anos para entender que é assim mesmo, algumas pessoas têm para sempre a carteirinha do clube dos desajustados.



sábado, 13 de junho de 2020

Goodbye New Jersey

Terminar uma série e a eterna sensação de luto por isso, que dilema mais frívolo e verdadeiro. Entretanto, com a idade preciso assumir que não sou essa pessoa de séries, fico enjoada de fazer a mesma coisa por muito tempo, a luz da televisão ou notebook me cansa a vista e às vezes me esqueço de dar continuidade. Por causa disso tudo, terminar uma série para mim é um pouco dramático e muito significativo.

 Essa semana, finalizei The Sopranos. Sei que muitas coisas são ditas sobre a maravilha dessa série e de sua importância, tudo o que dizem posso assegurar que são verdades. Esse seriado é essa Coca-Cola toda. Mas não vou falar sobre a indiscutível qualidade, vou falar sobre essa relação entre nós.

Sopranos era a minha série de domingo ou período de férias. Assistia apenas um episódio por dia.  Não me lembro quando comecei a assistir, creio que no mínimo há três anos, com longas pausas, outras séries nos intervalos, mas o prazer de saber que tinha uma temporada de Sopranos me esperando, era muito satisfatório, era o truco pra cima da rotina.

Comecei assistir ao seriado, pelo o que tudo aponta, por motivos bem adversos do normal, pois não sou entendida da máfia e não tenho muito estômago. Cheguei a série numa perseguição ao Don Draper, na busca de uma narrativa e linguagem atípica, um roteiro que se resolve nos detalhes. É muito importante salientar que sou fã das séries que as pessoas desanimam, embora acredito que Sopranos tenha a sutileza e a adrenalina muito bem presentes.

O lado imigrante italiano também me foi bastante interessante, qualquer pessoa com esse traço genético entende muito bem os dramas, a influência da matriarca na vida dos filhos e as relações familiares um pouco desequilibradas.


Agora, me resta desenrolar esse caminho, e ver se Tony Soprano e seus criadores me revelam uma outra série, e se consigo mais uma vez comprovar que uma história bem contada é o que importa para o telespectador, não importa a máfia, os anos 60, o escritório policial e qualquer outra atmosfera improvável.